quarta-feira, 21 de agosto de 2013

SINDICÂNCIA CONTRA ESTUDANTES DA UNESP FRANCA: ARBITRARIEDADES, NULIDADES E PERSEGUIÇÃO POLÍTICA.

Rafael Borges

No final do ano de 2012 o diretor da Unesp Franca, Professor Fernando Fernandes, publicou uma portaria instaurando uma sindicância contra 31 estudantes. O objetivo de tal procedimento administrativo seria apurar os fatos ocorridos durante uma manifestação organizada por mais de 200 pessoas da comunidade acadêmica local contra a presença no campus de D. Bertrand, porta-voz da extrema-direita brasileira e integrante de grupos que pregam o ódio. Mostraremos aqui, independentemente do juízo de valor que cada um faça sobre a manifestação ocorrida em Agosto de 2012, que a referida sindicância carece de legalidade desde o seu nascedouro e que a Administração da Faculdade, na pessoa do seu diretor Fernando Fernandes, violou constantemente os mais elementares princípios e garantias processuais asseguras pela legislação pátria.
Apuração ou Inquisição?
Em primeiro lugar é preciso destacar que não há nenhuma explicação plausível para a escolha dos 31 nomes da Sindicância. É de conhecimento geral, conforme mostram as imagens, que mais de 200 pessoas participaram do ato contra o “príncipe herdeiro”. Todavia, apenas uma pequena parcela foi incluída na sindicância e está ameaçada de sofrer algum tipo de sanção. Em várias ocasiões, o diretor, que “coincidentemente” é o orientador do grupo que organizou a atividade com D. Bertrand, confirmou que os nomes foram apontados pelos próprios membros do grupo que organizou a palestra. O diretor, se afastando das suas atribuições de administrador do campus e representante de toda a comunidade acadêmica, e se mostrando verdadeiro militante da causa dos grupos de extrema-direita do campus, acatou de prontidão a lista de nomes encaminhada, sem qualquer apuração prévia. A maneira como as pessoas foram apontadas para a sindicância foi tão precária que algumas pessoas da lista sequer estavam na faculdade no dia do ato.
Imediatamente, o Diretor montou uma comissão processante formada por professores indicados por ele mesmo (!). Ou seja, o próprio orientador do grupo se torna o acusador e este, por sua vez, indica os nomes daqueles que irão decidir sobre o caso. Importante lembrar que os professores escolhidos foram cirurgicamente selecionados entre aqueles ferrenhos defensores do latifúndio e do agro negócio, posição esta em consonância com a visão de mundo de D. Bertrand. Além disso, a administração também criou inúmeros embaraços para que as pessoas mencionadas na portaria pudessem ter acesso aos autos do processo. E para referendar seu autoritarismo o diretor ainda substituiu, sem qualquer motivo, os nomes constantes da sindicância. O diretor do campus de Franca acusa, investiga e julga. Fenômeno que no direito processual penal ganha o nome de procedimento inquisitivo.
 A administração da Unesp, na sua sanha repressiva e persecutória contra os estudantes que participam do movimento estudantil, pisoteou o dispositivo constitucional que assegura os princípios do contraditório e da ampla defesa nos procedimentos administrativos. Vale lembrar que esses descalabros não são “privilégios” do diretor de Franca. Recentemente, a administração do campus de Araraquara abriu uma sindicância, e com um completo cerceamento de Defesa, expulsou sumariamente alguns estudantes da moradia estudantil. Definitivamente, se depender dos diretores e da Reitoria, os direitos e garantias fundamentais consubstanciados no célebre artigo 5º da nossa Carta Magna não serão respeitados em terras “unespianas”. 
Destaca-se que, mesmo transcorrido nove meses da publicação da portaria que instaurou a sindicância, as pessoas ainda não foram sequer citadas para tomarem conhecimento das acusações a qual são imputadas. Como se não bastasse as freqüentes violações aos princípios do contraditório e da ampla defesa, a administração do campus de Franca está fazendo com que o procedimento se arraste indefinidamente no tempo. Desse modo, a direção, antes sequer do início da apuração, já está punindo os estudantes formandos (já que estes estão impossibilitados de receber o certificado e de trabalhar) e transforma a sindicância num instrumento de disseminação de medo e ameaças contra os alunos mais novos que pretendem participar do movimento estudantil.
Arbitrariedade: Faculdade impede que formandos recebam seus certificados
Em meio a esse mar de arbitrariedades, sem dúvida, uma delas ganha a atenção. A direção de faculdade, amparada pela procuradoria da Unesp, decidiu não liberar os certificados para os formandos que foram sindicados. Pior, forneceu um documento discriminatório onde destaca que tais pessoas só fariam a colação de grau com o término da sindicância. O diretor Fernando Fernandes, professor do curso de Direito da faculdade, como já dissemos aplicou uma pena (a não colação de grau) antes da própria apuração.
Diante de tamanha violação ao seu direito adquirido alguns alunos impetraram mandados de segurança contra esses abusos do diretor do campus. Não nos surpreendeu que tais atos da direção do campus tenham causado extrema indignação até mesmo nos frios corredores do Tribunal de Justiça de São Paulo. O Desembargador Luiz Sergio Fernandes, em julgamento do Agravo de Instrumento interposto pela faculdade, externou sua opinião da seguinte maneira:

“A pretensão da autoridade administrativa e da Universidade Paulista constitui-se um verdadeiro assombro de arbitrariedade, máxime em se cuidando de um espaço público, no qual não se pode admitir que o necessário esclarecimento das pessoas envolvidas no episódio transborde para um exemplo estarrecedor de autoritarismo e abuso de poder.” (SÃO PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000 Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes De Souza)

A orientação da procuradoria da UNESP de negar a liberação dos certificados e conceder apenas um documento discriminatório também foi duramente condenada pelo Relator do acórdão:

“O pretendido condicionamento no certificado “... o grau alcançado será conferido  somente após o término de sindicância” , constitui-se, portanto, em termos singelos, pura arbitrariedade que espanta até mesmo o Relator, que com mais de trinta anos de judicatura, vinte dos quais judicando na área de Direito Público, ainda é capaz de se surpreender com a criatividade de certas autoridades administrativas, quando se trata de praticar atos arbitrários.” (SÃO PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000 Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes De Souza)

Importante lembrar que a Egrégia Congregação, instância máxima de decisão do campus, votou, por unanimidade, uma nota de repúdio a abertura da sindicância contra os estudantes. Contudo, o diretor Fernando Fernandes, conhecido pela sua falta de diálogo com a comunidade acadêmica, simplesmente ignorou esse fato e segue trabalhando arduamente para sancionar àqueles que defendem o caráter público e laico da universidade.

Sindicância a serviço de uma política persecutória

O que desenvolvemos a cima apenas demonstra como a dita sindicância, contaminada desde a sua raiz por vícios e nulidades, é, na realidade, um instrumento que a direção se vale para gerar um constante medo contra os estudantes que almejam participar do movimento estudantil.
Uma simples visualização dos autos da sindicância mostra o seu verdadeiro objetivo. São páginas e mais páginas destinadas a mostrar a predisposição política e ideológica das pessoas, inclusive com investigações em redes sociais. Também constam nos autos, evidenciando o verdadeiros interesse por trás da sindicância, ofícios de grupos e partidos de extrema-direita exigindo repressão aos envolvidos. O Diretor, lamentavelmente, tem dado mais atenção aos resmungos de representantes da nova ARENA (o partido que sustentou a ditadura) do que a própria Congregação do Campus. Parece que o entendimento de que tal sindicância tem um forte caráter de perseguição também é compartilhado pelos magistrados do TJ que julgaram recente mandado de segurança impetrado por uma aluna:

“É por essas razões que causa perplexidade que uma universidade pública, que é um centro de excelência de ensino e pesquisa e gerida por preparados e respeitáveis professores, venha a resvalar em perseguições e arbitrariedades como a relatada nesse agravo.” (SÃO PAULO, Tribunal de Justiça, AI 0069588-46.2013.8.26.0000 Rel: Des. Luiz Sergio Fernandes de Souza)


Não há mais dúvida sobre os vícios e nulidades nessa sindicância. Também pensamos que sejam claros os objetivos persecutórios envolvidos nesse procedimento. Diante de tamanho absurdo, condenado até mesmo pelos desembargadores do Tribunal de Justiça de SP, se faz necessário que a direção libere imediatamente o certificado, sem qualquer restrição ou discriminação, para todos os alunos sindicados que já tenham reunido as condições acadêmicas para colação de grau. Tendo em vista o longo período que se passou sem que tenha ocorrido sequer a citação dos envolvidos, desrespeitando assim outro princípio constitucional (CF/88, LXXVIII, a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.) é preciso dissolver e encerrar os trabalhos dessa sindicância o mais rápido possível. Com a palavra, a administração da UNESP-Franca.    

terça-feira, 6 de agosto de 2013

RESGATAR A RESISTÊNCIA DO PASSADO PARA CONSTRUIR AS LUTAS DO PRESENTE: 45 ANOS DA GREVE DA COBRASMA EM OSASCO!

No mês passado lembramos os 45 anos da grande greve dos operários da Cobrasma, em Osasco, região da Grande São Paulo. Na ocasião, no dia 16 de julho de 1968, milhares de operários dessa fábrica, dirigidos pelo então presidente do sindicato dos metalúrgicos de Osasco, José Ibrahim, resolveram deflagrar uma greve, com ocupação de parte das instalações da fábrica, contra as sucessivas e arbitrárias intervenções da ditadura nos sindicatos e também contra a política econômica dos militares que, a partir de um forte arrocho salarial e níveis insuportáveis de exploração nas linhas de produção, favorecia diretamente as grandes empresas estrangeiras e arrastava a classe trabalhadora para níveis de extrema pobreza.

O golpe cívico-militar de Março de 1964, orquestrado por setores da burguesia brasileira em estreita colaboração com o imperialismo norte-americano, havia aberto um período de extrema repressão ao movimento operário organizado e uma perseguição implacável aos dirigentes sindicais que minimamente estivessem dispostos a lutar por melhores condições de trabalho. Tratava-se, para a burguesia e seus agentes militares, naquele momento, de impedir qualquer mobilização ou questionamento ao modelo econômico que formaria as bases daquilo que, alguns anos mais tarde, viria a ser conhecido como “milagre econômico”, um modelo de lucros fabulosos para a burguesia com aumento vertiginoso da desigualdade social.
A violência das forças repressivas da Ditadura era acompanhada por uma política estatal de incentivo ao desenvolvimento de um tipo de sindicalismo pelego, distante das bases, completamente atrelado aos patrões e ao Estado cujo objetivo máximo era a garantia da estabilidade política para a classe dominante.
Em Osasco, entretanto, no ano de 1967, a oposição sindical da categoria dos metalúrgicos conseguiu se organizar e vencer os pelegos ligados aos militares. Agora, com um sindicato mais combativo, democrático e atuante, começou a ganhar corpo entre os operários da categoria, sobretudo nos funcionários da Cobrasma, a idéia de organizar uma greve e uma ocupação da fábrica contra a política econômica dos militares e o arrocho salarial. Em 1968, ano de uma importante ofensiva do movimento de massas a nível internacional, os operários da Cobrasma, influenciados pela greve dos operários do setor siderúrgico de Contagem/MG ocorrida no mês de Abril desse mesmo ano, iniciaram, na manhã do dia 16 de julho, a paralisação da produção e ocupação da fábrica. 

A greve foi duramente reprimida. Mesmo com a forte resistência dos operários, as forças de repressão do governo retomaram a fábrica e prenderam dezenas de trabalhadores e membros do sindicato. Para a ditadura militar brasileira era fundamental a repressão contra esses operários que ousavam desafiar o regime e questionar sua política econômica conservadora. Entretanto, mesmo derrotada, a luta dos operários de Osasco deixou marcas profundas na realidade política da época e foi determinante para o surgimento, uma década depois, de um novo processo de resistência operária contra a Ditadura, dessa vez na região do ABC paulista e que deu origem, posteriormente, ao PT e a Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Não há a menor dúvida que a luta dos operários de Osasco em 1968 foi uma das batalhas mais importante da classe operária brasileira. A greve dos operários da Cobrasma, assim como a greve dos trabalhadores de Contagem/MG, merece um lugar de destaque na História do país, pois marcou, sem dúvida, os primeiros passos da resistência contra a Ditadura brasileira.

Hoje, 45 anos após a heróica luta dos operários da Cobrasma, não vivemos mais em um regime ditatorial, mas ainda sim há muita exploração e assédio nas fábricas e o governo, agora com Dilma e o PT à frente, mantém uma política econômica que só beneficia os grandes empresários, o agro-negócio e os banqueiros. A classe trabalhadora brasileira, cada vez mais, acumula dívidas para poder consumir. Os serviços públicos, como a saúde e a educação, vivem um verdadeiro caos, enquanto bilhões são investidos em estádios luxuosos para os turistas ricos que virão para o Brasil durante a Copa de 2014 e as Olimpíadas de 2016. É contra todo esse esquema espúrio e essa situação precária que milhões saíram às ruas em todo o Brasil durante o mês de Junho. A classe trabalhadora também é parte ativa desse mesmo processo de luta e no último dia 11 de julho protagonizou uma forte mobilização nacional com greves e protestos por todo o país.
No próximo dia 30 de Agosto a CSP-Conlutas e demais centrais sindicais estão organizando um novo dia de mobilização. Um dia para paralisar todas as categorias do país e exigir mais uma vez do governo menos dinheiro para copa e mais para a saúde e educação, redução da jornada de trabalho sem diminuição do salário, fim das privatizações, reforma agrária e outros pontos que interessam a nossa classe.

A classe trabalhadora de Osasco e Região, que como vimos já protagonizou lutas de importância histórica, está mais uma vez convocada a entrar em cena e se somar a essa luta. A melhor forma de honrar o grandioso passado de lutas dos trabalhadores de Osasco é justamente construir a luta no presente em nossa cidade. Metalúrgicos, operários químicos, professores, funcionários públicos, profissionais da saúde e do comércio devem discutir em seus locais de trabalho a proposta de paralisação e exigir dos seus sindicatos que estejam nessa luta. Com toda certeza, no próximo dia 30 de agosto, os trabalhadores de Osasco e Região escreverão mais um capítulo da sua rica história de luta.